quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Daquilo que se é

“Se não fossem as minhas malas cheias de memórias
Ou aquela história que faz mais de um ano
Não fossem os danos
Não seria eu.”


Dia desses me disseram que só é possível mensurar se algo é bom ou ruim pelas consequências que ela traz, e eu que já reclamei tanto da minha vida me vejo tendo que aprender a engolir as reclamações e agradecer as pesadas malas de memórias que carrego e mais do que isso, ter amor pelos meus danos e cicatrizes: sem eles eu não seria eu.

“Se não fossem as minhas tias com todos os mimos
Ou se eu menino fosse mais amado
Se não desse errado
Não seria eu.”


Como é que a gente aprende a amar caminhos tortos? Vida que é toda errada? Essa teoria toda de agradecer sempre, até pelo ruim, como é que pratica? Tem fórmula? Chega mesmo esse momento na vida que alcançamos esse nível de sabedoria e compreensão de entender e agradecer pois se não desse tudo errado, "eu não seria eu"?

“Se o fato é que eu sou muito do seu desagrado
Não quero ser chato
Mas vou ser honesto
Eu não sei o que você tem contra mim
Você pode tentar por horas me deixar culpado
Mas vai dar errado
Já que foi o resto da vida inteira que me fez assim.”


A vida é isso meu bem, a vida é isso: esperar e desesperar, ou não esperar coisa alguma, mas a vida é isso: em algum tempo decepcionar em outro decepcionar-se, ter alguém com algo contra, S-E-M-P-R-E, por melhor que sejam suas intenções.
Já tive a sensação nada agradável de carregar culpas que não era minhas, já carreguei pessoas que me doeram em tempo integral, duzentos baldes de lágrimas, três meses de cara inchada e deu tudo errado, a vida me fez pra feliz.

“Se não fossem os ais
E não fosse a dor
E essa mania de lembrar de tudo feito um gravador
Se não fosse Deus
Bancando o escritor”


E essa natureza teimosa de aceitar a dor, mas nunca o sofrimento? Essa natureza burra, de além de sentir visceralmente a minha dor, acatar a dor alheia e guardar, não por escolha, mas por ter essa memória de gravador, as cores, os cheiros, os sons, as sensações, tudo por ad eternun. Sem tudo isso, eu seria eu?

“Se não fosse o mickey e as terças feiras e os ursos pandas e o andar de cima da
Primeira casa em que eu morei e dava pra chegar no morro só pela varanda se
Não fosse a fome e essas crianças e esse cachorro e o Sancho Pança se não fosse o
Koni e o Capitão Gancho
Não seria eu.”


Se não fosse meu amor pelas coisas que ninguém mais amaria, os significados nas coisas mais insignificantes, uma dor no coração porque um parque está abandonado e porque não tem mais meu refresco favorito no único café que eu realmente acredito que valha a pena frequentar, ou uma mania idiota de todos os dias olhar a capela mortuária pra ver se alguém morreu e rezar pela alma dessa pessoa que eu nem conheci, ou a minha mania fútil de mensalmente comprar sapatos pela internet, se não fosse meu pai que morreu quando eu tinha cinco anos, se não fosse a história da vizinha do cinco que outro dia me trouxe um bolo delicioso apesar de todos seus problemas, se não fosse a moça problemática que me fez tanto mal, e se não fosse a dor, não, eu não seria eu.

Brincando de interpretar a música  Capitão Gancho da Clarisse Falcão que você pode ouvir aqui

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